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Meio Jurídico

Depois de nove meses de convivência com seus pais adotivos, menina de pouco mais de um ano viu sua história mudar de rumo quando uma tia biológica conseguiu a guarda provisória. Diante da decisão, os pais adotivos recorreram ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), alegando que a ruptura poderia trazer graves prejuízos emocionais à filha de coração, já que ela já havia criado laços profundos com a nova família.

O STJ acabou mantendo a criança com os pais adotivos. Para chegar a essa decisão, os ministros levaram em conta o chamado princípio do melhor interesse da criança, além de um laudo psicossocial que confirmava que a menina estava segura, bem cuidada e plenamente adaptada ao lar adotivo. Para a advogada Shirlei Alexandre, especialista em Direito de Família, o caso mostra a importância de olhar para além do vínculo de sangue: “O amor e a convivência constroem laços que não podem ser simplesmente desfeitos. O Judiciário tem entendido, cada vez mais, que o melhor interesse da criança está em preservar esses vínculos afetivos já formados.”

No Brasil, a adoção é regida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA – Lei 8.069/1990). Quem deseja adotar passa por avaliação psicossocial, cursos preparatórios e só depois entra para a fila de habilitados no Cadastro Nacional de Adoção. A adoção é concluída apenas com sentença judicial, que garante à criança todos os direitos do filho.

Já a guarda, que pode ser provisória, é um instrumento usado para proteger a criança durante o processo ou em disputas familiares. A advogada Tais Gusmão explica que, nesses casos, o afeto pode pesar mais que o sangue: “É essencial que o sistema de Justiça ofereça segurança às famílias adotivas e, principalmente, às crianças. A ruptura de vínculos pode ser traumática. O que deve prevalecer é a estabilidade emocional e o bem-estar do menor, ainda que isso contrarie interesses formais da família biológica.”

Esse entendimento está na Constituição (art. 227) e no ECA (art. 4º), que assegura prioridade absoluta aos direitos das crianças e adolescentes. Na prática, significa que o Judiciário deve olhar primeiro para a proteção integral e o desenvolvimento saudável do menor. O maior desafio da Justiça, segundo as especialistas, é equilibrar os direitos. A família biológica tem prioridade, sim, mas apenas até o momento em que a criança ainda não tenha estabelecido vínculos fortes com outra família. 

Quando esse laço afetivo já existe, o princípio do melhor interesse da criança passa a prevalecer. Tanto o STJ quanto o STF já reconheceram que a paternidade e a maternidade socioafetivas — aquelas construídas no dia a dia, pelo cuidado e pelo amor — podem ser tão ou até mais importantes que o vínculo biológico.