O Sistema Único de Saúde é o mais completo e elogiado internacionalmente. Através de inúmeros programas atua sob princípios da universalidade, integralidade e equidade na prestação de saúde pública, desde serviços mais básicos aos procedimentos de maior complexidade, como transplante de órgãos, no que é alto referencial na medicina. Assim, está cumprindo exemplarmente o conceito constitucional de “saúde direito de todos e dever do Estado”.
O SUS foi criado no governo José Sarney e implantado no governo Fernando Collor, cabendo a implementação ao paranaense Alceni Guerra, então ministro da Saúde. A oficialização ocorreu em 1990, porém as tratativas, discussões e debates que deram a forma exitosa do programa tiveram início quase dez anos antes.
Tive a oportunidade (e a honra) de participar desse processo como presidente da Comissão de Saúde da Câmara Federal. Pode-se dizer que o embrião do SUS se deu no Simpósio Nacional de Saúde, ao qual fui escolhido para presidir. Foram realizados quatro eventos desses, entre 1981 a 1984. E foi o grande fórum popular de debates que acabou gerando um projeto tão bom e completo que assim foi encaminhado ao Congresso Nacional e depois à Assembleia Constituinte.
Para dar amplitude nacional ao movimento de criação do Sistema Nacional de Saúde e maior peso e repercussão dos debates e decisões, foi instituído o Parlamento Brasileiro da Saúde, instalado oficial e solenemente na cidade de Manaus em abril de 1984. Congregava integrantes das Comissões de Saúde da Câmara Federal, do Senado e das Assembleias Legislativas Estaduais, todos com pleno conhecimento das dificuldades dessa área, por isso ofereceu também amplo e realístico diagnóstico da situação da saúde pública no país. Fui eleito pelos colegas para presidir essa entidade que desempenhou papel importante no movimento, organizando debates com a sociedade civil por todo o Brasil, visando à formalização do projeto do Sistema Nacional de Saúde, hoje conhecido como Sistema Único de Saúde – ou SUS.
A seriedade e o comprometimento dos participantes daqueles eventos foram fundamentais para levar a bom termo a tarefa, que era enorme e complexa, pois se tratava de efetivar a transferência e ampliação do atendimento à saúde da população geral, saindo do Ministério da Previdência e passando para o Ministério da Saúde. E, além disso, deveria trazer para o compartilhamento (dos bônus e ônus) os demais entes – estados e municípios - que formariam com a União o sistema tripartite de administração, execução e custeio da política de saúde pública no país.
O sucesso e a credibilidade do SUS hoje devem-se ao trabalho daquele tempo. Os intensos debates do projeto foram desenvolvidos em alto nível, sem nenhum viés partidário ou ideológico, com total impessoalidade, focados unicamente no bem comum. Foi notável ver a união e entendimento entre direita e esquerda. E assim tinha de ser porque a tarefa era de debate e convencimento, por isso as inúmeras reuniões e até audiências públicas com representantes das classes sociais, dos sindicatos, dos prepostos de estados e municípios.
Esse exaustivo trabalho de preparação foi deveras importante; basta observar que os Estados Unidos perderam exatamente nesse quesito. O presidente Barack Obama desejava implantar em seu país um sistema semelhante para solucionar problemas no atendimento da população em serviços de saúde pública. Ele simplesmente formulou o projeto e o enviou para votação. Não conseguiu êxito algum. Enquanto o SUS garante acesso universal e gratuito ao sistema público de saúde, com foco em ações de promoção, prevenção e tratamento em todos os níveis de complexidade, os EUA têm o sistema mais caro do mundo e a saúde pública excessivamente problemática. Quanto ao SUS, continua sendo modelo reconhecido internacionalmente e um dos maiores sistemas de saúde pública do mundo.
E finalmente resta dizer que o acerto na concepção e execução do Sistema Único de Saúde está tornando o SUS em exemplo, modelo para outras áreas. Acaba de ser aprovada na Câmara Federal a regulamentação do Sistema Nacional de Educação (SNE), visto como passo histórico na coordenação entre União, estados e municípios, fixando normas para cooperação técnica e financeira a fim de garantir educação de qualidade.
Espera-se que o apelidado “SUS da Educação” venha a se tornar tão exitoso quanto o da saúde. Bom seria que todos os programas e políticas governamentais tivessem o mesmo ideal e o mesmo sucesso.
*Luiz Carlos Borges da Silveira é médico, ex-ministro da Saúde, ex-secretário de Ciência e Tecnologia do Governo do Estado do Tocantins e ex-secretário do Desenvolvimento Econômico, Ciência e Emprego do Município de Palmas-TO.