“Uma comunidade esquecida e com visível violação dos direitos humanos”, assim foi a definição no Relatório sobre a comunidade remanescente de quilombola Kalunga do Mimoso, distante 130 km de Arraias, na região Sul do Estado. O documento foi elaborado pela Defensoria Pública do Tocantins e apresentado aos poderes público e privado, e também à comunidade local durante a Audiência Pública realizada no Município nesta quarta-feira, 5.
“A intenção desta Audiência Pública é discutir com todos os órgãos competentes para solucionar os problemas desta comunidade de forma extrajudicial, porém o mais importante é ouvir da comunidade o que elas precisam; afinal, tudo o que será feito reflete diretamente na vida deles”, afirmou o coordenador do NAC, defensor público Arthur Marques.
Atendimentos
A Defensoria Pública realizou ação para a comunidade quilombola, levando até essas pessoas o acesso à justiça e aos serviços públicos básicos. Desse momento, foi feito um Relatório sobre as condições de vida da Comunidade. “Nós pudemos perceber que falta o básico como água tratada, energia elétrica, estradas melhores, atendimento de saúde, educação; orientação quanto à titularidade da terra, e assistência técnica qualificada para auxiliar na produção dos remanescentes. Esses são os principais problemas diagnosticados e que nós, como defensores dos direitos dos mais carentes, temos a missão de ajudá-los a conquistar”, esclareceu a defensora pública de Arraias, Kenia Martins.
Antes da Audiência Pública mais de 40 ofícios foram enviados a empresas e poderes públicos do Município, Estado e União, solicitando informações e providências quanto a necessidades básica das famílias que moram no local. Desses ofícios, alguns já tiveram respostas concretas como é o caso do Grupo EDP Energias do Brasil, grupo português que juntamente com a Companhia de Energia Elétrica do Tocantins (Celtins), vão implementar as ações do Programa “Luz para Todos Rural”, ficando estabelecido que a rede de energia elétrica será instalada no prazo máximo de 1 ano. Além disso, como cumprimento do dever de responsabilidade social, a empresa vai doar uma quantia em dinheiro no valor de R$ 30 mil para a compra de uma máquina de farinha, ou outros benefícios para a comunidade.
Quanto à água, a Funasa já disponibilizou um recurso de R$ 240 mil reais para a implantação do projeto de saneamento do local, porém este valor ainda não foi aplicado nem prestado conta por parte da Prefeitura de Arraias.
Já quanto ao problema de saúde, foi recomendada à Secretaria Municipal de Saúde a instalação permanente do Programa Saúde da Família (PSF), para atendimento básico e trabalhos de prevenção.
O prefeito de Arraias, Wagner Gentil, respondeu aos questionamentos dizendo que o Município não consegue realizar todas essas ações sozinho, sem parceria de Estado e União. Quanto ao recurso da Funasa, o prefeito afirmou que o projeto foi aprovado somente no mês de junho, e que o recurso já está sendo empregado. Quanto ao atendimento de saúde, ele argumentou que tem feito o que está dentro do orçado e do planejado pela administração municipal, sendo que não possui condições financeiras e estruturais de realizar algo a mais sem parceria.
Outro problema exposto na Audiência Pública foi a desapropriação da terra e titularidade definitiva dos lotes. Para isso, o Incra esclareceu que já vem trabalhando na vistoria e avaliação da terra. Cerca de 43 mil hectares já foram vistoriados e a previsão é que até novembro este trabalho seja finalizado. “De acordo com o nosso cronograma, este trabalho era para ser concluído antes, mas com a greve dos servidores federais esse prazo não será cumprido. Nós vamos continuar trabalhando e dando o prosseguimento a este trabalho que, ano que vem, deve entrar na segunda etapa, que é a de desapropriação e indenização”, afirmou Eleusa Gutemberg.
O defensor público Hud Ribeiro, que atua diretamente com a questão de regularização fundiária em diversas comunidades do interior do Estado, também participou da Audiência Pública e reforçou a importância de se ter uma atenção voltada ao campo. “A comunidade da zona rural precisa de assistência e, nesse sentido, o Ruraltins é um órgão muito importante para orientar os produtores. Além disso, faço aqui um pedido ao defensor público geral para que este projeto de atendimento ao pessoal no campo seja um programa permanente da Instituição, para levar acesso à justiça a todos que estão muitas vezes esquecidos pelo poder público. Isso incentiva o acordo e evita demandas judiciais”, disse.
Em Ata, ficaram estabelecidas as responsabilidades: à Prefeitura cabe o compromisso de continuar com a construção da Escola Padrão na Comunidade seguindo os prazos estabelecidos no cronograma; cumprir as Recomendações da Defensoria Pública em específico na área de saúde, com a visita mensal de agentes; comprovação da aplicação do recurso destinado pela FUNASA; e reestruturar a Secretaria Municipal de Agricultura. Já o Estado se comprometeu em disponibilizar maquinário no prazo máximo de 15 dias, para iniciar a recuperação das estradas vicinais e conclusão antes do período chuvoso; à Defensoria Pública fica a responsabilidade de se reunir com os proprietários de terra e representantes de quilombola, para juntos estabeleceram um Termo de Ajuste de Conduta que define áreas e limites de plantio e produção dos moradores, bem como dar encaminhamento aos órgãos responsáveis pelo que foi discutido durante a audiência.
O presidente da Associação dos Moradores de Kalunga do Mimoso, Emílio dos Santos Rosa, parabenizou a iniciativa. “Nós estamos satisfeitos, pela primeira vez alguém veio nos ajudar e nos orientar mesmo sobre o que a gente tem direito sem nada em troca”, afirmou Emílio.
Para o defensor público geral, Marcello Tomaz de Souza, trabalho como este é a missão maior da Defensoria Pública. “Nós temos como missão assegurar o direito à cidadania e a justiça efetiva. Nesse sentido, a Audiência Pública vem para somar com o trabalho desenvolvido pela Instituição e procurar sanar esses problemas de forma extrajudicial e em comum acordo entre as partes. Este é um trabalho que vamos desenvolver em todas as comunidades que estão à margem da civilização”, disse o Marcello Tomaz.
“Não podemos esperar mais 100 anos para solucionar essas demandas. A partir de agora, a Defensoria Pública vai ser a pele, o suor, o trabalho, a voz dos moradores da comunidade remanescente de quilombola de Kalunga do Mimoso, trabalhando para que esse povo não seja mais esquecido e que tenham seus direitos garantidos”, finalizou o defensor público Arthur Marques. (Ascom DPE)