Denunciado como responsável por provocar o acidente que matou três mulheres e feriu gravemente um homem na Avenida Teotônio Segurado, em Palmas, o procurador do Estado, Ivanez Ribeiro Campos, foi condenado por homicídio culposo a uma pena de quatro anos de prisão.
Ao fazer a dosimetria da pena, considerando que o réu não era reincidente e que o crime - ocorrido em 4 de abril de 2009 - foi considerado culposo (sem a intenção de matar), o juiz Allan Martins Ferreira substituiu a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos - pagamento de 60 salários mínimos (R$ 62,7 mil) para cada uma das famílias das três vítimas fatais e prestação de serviços comunitários pelo período da condenação.
Segundo o artigo 44 do Código Penal, o réu tem direito a penas restritivas de direito quando condenado a até quatro anos, for primário e ainda se o crime for culposo.
Titular da 2ª Vara Criminal de Porto Nacional e auxiliando a 2ª Vara Criminal de Palmas, o magistrado também suspendeu por um ano, com base no artigo 293 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), a permissão ou obtenção de habilitação do réu para dirigir veículo automotor, face a gravidade do crime. O juiz optou por não definir o valor mínimo da indenização civil pedida na inicial, de acordo com o artigo 387, inciso IV do Código de Processo Penal, alegando que este poderá ser analisado na esfera cível, caso os envolvidos tenham interesse.
Crimes, leis, códigos e penas
Consta nos autos que, no final da tarde de 4 de abril de 2009, o procurador do Estado Ivanez Ribeiro Campos, dirigindo na contramão de direção e aparentemente sob efeito de álcool, colidiu frontalmente sua camionete Mitsubishi/L200 contra um veículo Toyota/Corolla, provocando a morte de Aracy da Silva Campelo Pinto, Maurilene Alexandre da Silva Carneiro e Flávia Chaves Cardeal de Oliveira, esta última esposa de Mozart Dimas Oliveira, que conduzia o veículo e que sofreu uma lesão grave.
Baseada, entre outros, nos artigos 121 do Código Penal, e 292 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) à época, a acusação inicial foi pelos crimes de triplo homicídio por dolo eventual e lesão corporal grave.
A denúncia, feita do Ministério Público Estadual (MPE), foi recebida em 30 de abril de 2009, culminando na pronúncia do procurador - quando o juiz submete o acusado a júri popular, o que gerou a interposição de recurso pela defesa.
Na 2ª instância, os magistrados entenderam que não havia indícios suficientes de que o réu teria agido dolosamente, ou seja, com intenção matar, o que acabou na anulação da denúncia de homicídio por dolo eventual e lesão corporal, além da pronúncia, que ocorrera em 30 de maio de 2011.
Ao entendimento do Tribunal de Justiça do Tocantins (TJTO), seguiu-se então o aditamento da denúncia feita pelo MPE, desta vez imputando ao procurador do Estado Ivanez Ribeiro Campos os crimes de homicídio culposo, lesão corporal culposa e embriaguez na direção de veículo automotor, agora baseados nos artigos 302, 303 e 306 do Código Brasileiro de Trânsito (CBT).
Cabe lembrar que tanto a decisão em segunda instância, na primeira denúncia do MPE, quanto a atual decisão do juiz Allan Martins Ferreira ocorreram antes da atualização do CBT, com a inclusão, pela Lei nº 13.546, de 2017, do parágrafo terceiro do Artigo 302.
Nele, consta que para "o agente que conduz veículo automotor sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência", a pena será de, entre outras, reclusão de cinco a oito anos. Ou seja, atualmente, via de regra, se o condutor, sob efeito de álcool, se envolver em acidente de trânsito e causar a morte de alguém, irá responder pelo parágrafo terceiro do Artigo 302, e não mais somente pelo Artigo 121 do Código Penal ou o Artigo 302, parágrafo 1º, inciso V. do CBT, cuja pena é de dois a quatro anos.
Condenação e prescrição
"A imprudência do acusado, que, sob efeito de álcool, invadiu a contramão de direção em via pavimentada, suficientemente sinalizada vertical e horizontalmente, restou provada", frisou o juiz Allan Martins Ferreira, ao refutar a tese da defesa que pediu a absolvição do procurador do Estado Ivanez Ribeiro Campos pelo crime de homicídio culposo, alegando que o acidente teria ocorrido por falta de sinalização na bifurcação das vias que dão acesso à pista dupla da Avenida Teotônio Segurado.
Ao lembrar que a via pavimentada era suficientemente sinalizada vertical e horizontalmente, o magistrado ressaltou que "os policiais que o prenderam em flagrante garantiram que o réu, quando abordado, apresentava sinais visíveis de ter ingerido bebida alcoólica, como a fala desconexa e o hálito etílico".
Destacou ainda como causa do acidente o fato de o réu estar dirigindo o seu veículo na contramão, tendo como circunstâncias agravantes a velocidade de tráfego do veículo acima do permitido (84,90 km/h), além do seu estado de embriaguez.
Baseado nas informações dos policiais e no laudo pericial, o juiz refutou o depoimento do procurador do Estado, de que seu estado de sonolência, com perda de reflexos, foi causado por uso de medicamentos.
Denunciado também por embriaguez na direção de veículo automotor, o procurador foi absolvido pelo juiz Allan Martins Ferreira, em razão de, à época dos fatos, o artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, com redação dada pela Lei 11.705/08, "exigia para a comprovação do delito de embriaguez ao volante a realização de prova técnica para apurar o teor de álcool no sangue do agente, não bastando a simples prova da embriaguez ao volante e da exposição de terceiros a dano potencial".
Na decisão, o juiz ressaltou que, embora houvesse nos autos a informação que o réu apresentava sinais de embriaguez por ocasião dos fatos - atestado pelos policiais que realizaram sua prisão em flagrante e de médicos que o atenderam -, não havia prova pericial para se verificar o teor de álcool em seu sangue, inviabilizando assim a configuração do tipo penal em tela.
Atualizado, o artigo 306 do CBT estabelece agora que a comprovação da embriaguez "poderá ser obtida mediante teste de alcoolemia ou toxicológico, exame clínico, perícia, vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o direito à contraprova".
Baseado em julgados do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e de outros tribunais, o magistrado rechaçou a prescrição dos crimes de homicídio culposo e de embriaguez, considerando prescrita apenas o crime de lesão corporal culposa.
"Visto que a pena máxima prevista para este crime é igual a dois anos, e transcorrido período superior ao exigido, qual seja, quatro anos, está prescrita a pretensão punitiva para o Estado em relação ao crime de lesão corporal culposa", arrematou o magistrado.
Confira íntegra da decisão aqui.