Banhos aromáticos, cromoterapia, perfumes importados e até alisamento de pelos. O mercado de luxo para animais de companhia movimentou R$ 75,4 bilhões em 2024 no Brasil, de acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet). A expansão do setor abre espaço para serviços que, embora atendam ao desejo dos tutores, levantam dúvidas sobre os reais benefícios para cães e gatos.
A humanização dos pets, fenômeno que se intensifica com a diversificação de produtos e serviços, nem sempre resulta em ganhos para os animais. Em alguns casos, práticas que visam ao bem-estar podem ser confundidas com excessos, causando efeitos adversos à saúde física e emocional. O debate se concentra em até que ponto o cuidado especial se mantém saudável e em que momento ultrapassa a linha do exagero.
“Temos visto procura crescente por procedimentos que não trazem ganhos para os pets, como chapinha nos pelos, penteados e tratamentos estéticos sem função clínica. Isso atende mais aos desejos dos tutores do que às reais necessidades dos animais”, afirma Fabiana Volkweis, professora de Medicina Veterinária do Centro Universitário de Brasília (CEUB).
Apesar das críticas, a especialista ressalta que nem toda vaidade é um erro. Há situações em que certos cuidados são necessários para a saúde. Raças com pelagem que embaraça com facilidade, por exemplo, exigem manutenção adequada para evitar desconforto ou problemas dermatológicos. Nesse contexto, a atenção estética se converte em prevenção clínica.
Outro segmento em expansão envolve terapias alternativas, como acupuntura, musicoterapia, aromaterapia e cromoterapia. A primeira apresenta eficácia comprovada para dores, distúrbios neurológicos e problemas locomotores, enquanto as demais ainda carecem de evidências científicas que sustentem benefícios diretos para os animais. Embora possam ser usadas como complemento, não substituem tratamentos convencionais indicados por médicos veterinários.
Entre os serviços de maior procura estão os banhos regulares, muitas vezes associados a perfumes e cosméticos. O hábito, no entanto, pode comprometer a barreira natural de proteção da pele dos cães, abrindo espaço para dermatites causadas por fungos e bactérias. O uso de fragrâncias em excesso também está relacionado a alergias e coceiras. A frequência ideal deve respeitar as necessidades individuais de cada animal, sempre com orientação profissional.
No caso de roupas, sapatos e acessórios, o critério principal deve ser o conforto. Peças que causam dificuldade de movimento, aumentam a temperatura corporal ou geram irritabilidade são sinais de que o adereço não é adequado. O comportamento do pet, como tentativas de retirar a roupa ou resistência ao toque, funciona como indicativo de desconforto.
O excesso de humanização, quando cães e gatos passam a ser tratados como pessoas, pode provocar mudanças de comportamento. Situações de ansiedade, insegurança, estresse e até agressividade estão entre os efeitos observados. A rotina desequilibrada interfere nos instintos naturais e na socialização, exigindo dos tutores atenção especial à forma como os cuidados são oferecidos.
Para manter a saúde emocional dos animais, especialistas recomendam práticas que incluam enriquecimento ambiental, atividades físicas e convívio social. Creches para pets são apontadas como alternativa válida, desde que haja adaptação adequada e avaliação prévia do local. O objetivo é assegurar que a experiência promova estímulos positivos, sem comprometer a segurança e o bem-estar.
O equilíbrio é o ponto central da discussão. A observação contínua do comportamento e das reações físicas do animal deve orientar a decisão sobre a manutenção ou não de determinados serviços. Sinais de desconforto, irritabilidade, mudanças na pelagem ou coceiras funcionam como alertas de que algo pode estar em excesso. Nesses casos, a recomendação é reavaliar a real necessidade dos procedimentos oferecidos.
A expansão do mercado pet de luxo reforça a necessidade de orientação profissional e de escolhas conscientes. Mais do que adotar práticas em função de tendências, os tutores precisam considerar o impacto direto na qualidade de vida de seus animais. O desafio está em conciliar a busca por cuidados diferenciados com a preservação da saúde e do comportamento natural de cães e gatos.