A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), em conjunto com suas sete organizações regionais,os partidos Psol e Rede e mais dez entidades amicus curiae, protocolaram manifestação no Supremo Tribunal Federal (STF) exigindo que o julgamento do marco temporal seja realizado no plenário físico. O pedido tem o objetivo de garantir a presença indígena em uma sessão que pode definir o rumo das demarcações de terras indígenas no país.
O julgamento, que envolve as ações ADC 87, ADI 7582, ADI 7583 e ADI 7586, foi liberado pelo ministro relator Gilmar Mendes e está agendado para iniciar no dia 5 de dezembro de forma virtual, com a votação eletrônica estendendo-se até 15 de dezembro.
Durante a Câmara de Conciliação, o ministro Gilmar Mendes deixou nítido que manterá o entendimento de que o marco temporal é inconstitucional. Ainda assim, sob a vigência da Lei do Genocídio Indígena, o marco temporal continuou sendo aplicado, gerando violência contra os povos indígenas e travando processos de demarcação.
No julgamento que se inicia nesta semana, estão em discussão propostas que enfraquecem as demarcações, como permitir que opositores acompanhem os trabalhos de campo, autorizar contestações a qualquer momento e reabrir debates sobre indenizações a invasores.
Soma-se a isso a pressão da Confederação Nacional de Agricultura e Pecuária (CNA) para impedir revisões de limites mesmo quando há erro do Estado e aplicar retroativamente a lei a demarcações feitas há décadas, incluindo as terras homologadas na COP30 — Kaxuyana-Tunayana (PA/AM), Estação Parecis (MT), Uirapuru (MT) e Manoki (MT) — e aquelas abrangidas por portarias declaratórias, como Comexatibá (BA) e Vista Alegre (AM). Para a APIB, isso desconsidera que os povos indígenas sempre estiveram aqui e que o Estado brasileiro deveria ter concluído a demarcação das terras indígenas em até cinco anos após a Constituição Federal, mas agora tenta restringi-las ainda mais.
Além da APIB, Psol e Rede, assinam a petição: Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste,Minas Gerais e Espirito Santo (Apoinme), Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), Conselho Indígena de Roraima (CIR), Associação das Comunidades Indígenas dos Tapeba de Caucaia, Comissão Arns, Conectas, Associação de Juízes e Juízas pela Democracia (AJD), Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Instituto Socioambiental (ISA), Instituto Alana, WWF, Greenpeace, Observatório do Clima e Associação Terrazul.
A exigência de participação ativa
A APIB, autora da ADI 7582 que reivindica a inconstitucionalidade da Lei 14.701/23, nomeada pelo movimento indígena como Lei do Genocídio Indígena, argumenta que a realização do julgamento em formato virtual exclui os povos indígenas, na condição de cidadãos brasileiros, de um momento histórico que os impacta de forma direta e definitiva.
O movimento indígena afirma que temas de tamanha relevância e impacto social exigem um debate presencial, transparente e com plena possibilidade de participação dos povos indígenas.
A Apib lembra que a Constituição Federal de 1988, por meio dos artigos 231 e 232, finalizou o ciclo de assimilação e tutela imposto aos povos originários, garantindo sua autonomia perante o Estado, inclusive possibilitando o ingresso em juízo para a defesa direta de seus direitos e interesses.
Contestação da Lei 14.701/2023
As ações que serão julgadas debatem a constitucionalidade da Lei 14.701/2023, que fixa o marco temporal como parâmetro para demarcação de terras, inviabilizando na prática a garantia desses territórios. O movimento indígena alega que esta lei foi promulgada sem a consulta adequada aos povos indígenas, violando a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
A Lei 14.701/2023 é considerada pela Apib como anti-indígena. Em setembro de 2023, o STF já havia considerado o marco temporal inconstitucional. Contudo, após a derrubada do veto presidencial pelo Congresso em dezembro de 2023, a tese do marco temporal prevaleceu, limitando o direito dos indígenas apenas às terras que estavam em sua posse em 5 de outubro de 1988 ou em disputa judicial na época.
A Apib e seus aliados buscam, por meio da ADI 7582, obter a declaração de inconstitucionalidade da Lei 14.701/2023, visando a efetiva presença dos povos indígenas, formal e materialmente, na jurisdição constitucional encarregada de proteger os direitos contramajoritários de populações vulneráveis.
Para saber mais sobre a luta dos povos indígenas contra o marco temporal, acesse o site:https://apiboficial.org/marcotemporal/
Sobre a APIB
A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) é uma instância de referência nacional do movimento indígena, criada de baixo para cima. Ela reúne sete organizações regionais indígenas (Apoinme, ArpinSudeste, ArpinSul, Aty Guasu, Conselho Terena, Coiab e Comissão Guarani Yvyrupa) e foi criada para fortalecer a união dos povos indígenas, a articulação entre as diferentes regiões e organizações, além de mobilizar contra ameaças e agressões aos direitos indígenas.

