Cerca de 30 especialistas brasileiros e estrangeiros de áreas diversas – indo da botânica à geologia, da paleontologia ao sensoriamento remoto – participaram da primeira reunião “presencial” com os integrantes de um Projeto Temático que investigará o que ocorreu com na Amazônia nos últimos 20 milhões de anos.
O projeto é apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo (FAPESP) e pela National Science Foundation (NSF) no âmbito de um acordo que prevê o desenvolvimento de atividades de cooperação entre os programas "Dimensions of Biodiversity" (NSF) e Biota (Fapesp). O estudo também conta com o apoio da agência espacial dos Estados Unidos, a Nasa.
“Essa pesquisa enorme e audaciosa é uma oportunidade de se fazer algo que poucos podem fazer”, afirmou o norte-americano Joel Cracraft, do American Museum of Natural History, pesquisador principal do projeto do lado americano, na abertura do simpósio “The assembly and evolution of the Amazonian biota and its environment”, na sede da Fapesp, em São Paulo, para uma plateia de 260 pessoas.
Entre as perguntas a serem respondidas pelo projeto estão: como era o ambiente e quais organismos povoaram a Amazônia? Qual é a explicação para tamanha biodiversidade encontrada hoje na região?
O primeiro dia da reunião (04/03) foi aberto ao público, que pôde conhecer um pouco sobre as linhas de pesquisa e planos de trabalho do grupo e ter uma ideia da especialidade de cada um dos integrantes.
Nos outros quatro dias da semana, os pesquisadores vão se reunir a portas fechadas para definir em detalhes o andamento da pesquisa. A pesquisadora principal do lado brasileiro e organizadora do simpósio é Lúcia Garcez Lohmann, professora do Departamento de Botânica do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP) e pesquisadora associada dos jardins botânicos de Nova York e do Missouri.
“Este não é um simpósio tradicional sobre a Amazônia. Queremos usar o simpósio para integrar os colaboradores a fim de que todos cantem a partir da mesma partitura. O projeto é maior do que a soma das pesquisas individuais”, disse Cracraft.
O Projeto Temático envolve instituições de vários países – seis brasileiras, oito norte-americanas, uma canadense, uma argentina e uma britânica. E ainda busca colaborações de especialistas interessados, principalmente brasileiros.
Um grande desafio será como lidar com a enorme quantidade de informações, provenientes de diferentes metodologias e disciplinas. “Uma das nossas metas nessa reunião é tentar entender como lidaremos com esses dados”, disse Cracraft.
A norte-americana Barbara Thiers, do New York Botanical Garden, foi uma das primeiras especialistas a se apresentar no simpósio. Ela falou sobre a importância dos dados de localização para os estudos biogeográficos e traçou um panorama sobre o que já existe no que se refere a bancos de dados de plantas amazônicas.
Segundo Thiers, há cerca de 120 herbários ativos no Brasil, com informações sobre aproximadamente 7 milhões de espécies de plantas. Na Amazônia, são reconhecidos entre 1 e 1,5 milhão de espécies.
Há poucas coleções de amostras de plantas amazônicas colhidas antes de 1900, feitas em sua maioria por europeus. Grande parte das amostras data de depois de 1960 – em especial entre 1975 e 1984, durante um programa binacional do Brasil e dos EUA.
A questão é que boa parte das amostras de plantas não contém informações sobre a latitude e longitude de onde foram encontradas. “Antes de 1980, não era rotina as amostras incluírem as geocoordenadas sobre as localidades onde haviam sido encontradas”, afirmou Thiers.
Para tentar montar esse quebra-cabeça, os pesquisadores, de acordo com ela, usarão vários instrumentos, entre eles o Google Maps.
Thomas Trombone, do American Museum of Natural History, contou que a sua contribuição ao projeto será tentar responder à questão sobre como a biodiversidade dos vertebrados está distribuída na Amazônia.
“Montaremos o maior banco de dados com informações sobre a Amazônia, será um Atlas da biodiversidade amazônica”, afirmou, acrescentando que os dados serão colocados em um portal na internet.
Grupos-modelo
Os pesquisadores envolvidos no Projeto Temático tentarão entender a origem, a estruturação e a evolução dos organismos que povoam e povoaram a Amazônia a partir de quatro grandes grupos: plantas, primatas, borboletas e aves.
“Em uma primeira etapa, estudaremos a história evolutiva desses organismos e caracterizaremos o ambiente amazônico, incluindo informações sobre a história geológica e ciclos biogeoquímicos”, disse Lohmann, especialista em sistemática de plantas, que estuda o parentesco e a história evolutiva de representantes da família Bignoniaceae, da qual fazem parte os ipês, os jacarandás e diversas espécies de cipós que compõem as florestas tropicais.
Dentro dos grupos-modelo, os pesquisadores pretendem reconstruir a filogenia, ou seja, “árvores evolutivas” desses grupos, bem como realizar estudos ao nível populacional de organismos selecionados.
“Como ainda sabemos muito pouco sobre a biodiversidade amazônica, tivemos que selecionar grupos-modelo, pois seria absolutamente inviável estudar toda a biota amazônica durante o período de vigência deste projeto”, disse Lohmann, que também é presidente da Association for Tropical Biology and Conservation (ATBC). (Agência Fapesp)