Cada eleição deixa lições importantes e cabe aos dirigentes partidários e políticos em geral o dever da compreensão, da análise e do proveito do recado das urnas. A recente eleição não foi diferente, o povo mandou muitas e claras mensagens que vão além do voto.
Havia uma preocupação de que o pleito poderia ser tumultuado, foi gerado infundado temor até sobre ameaças à democracia. Mas as eleições em si transcorreram em normalidade, evidenciando mais uma vez que o povo brasileiro é pacífico, ordeiro.
Outra relevante lição foi relativa às pesquisas, elevadas ao grau de oráculos infalíveis, o que está comprovado nesta e em outras ocasiões que isso não é verdade.
Pesquisa é uma ciência, empresas usam tal ferramenta para avaliar produtos e mercados. Todavia, na política eleitoral tem um trato bem diverso, são visivelmente mal utilizada, com viés de parcialidade para induzir o eleitor.
Infelizmente, o resultado das pesquisas tem poder subliminar de influenciar e até direcionar o voto, inclusive porque o eleitor não quer perder o voto, isso é da nossa cultura. A proposital indução fica muito clara quando o patrocinador ou contratante do trabalho é ou está diretamente interessado no resultado.
Os episódios estão ainda bem frescos na memória. Foram erros e discrepâncias tão crassos que não podem ser debitados apenas a volubilidade do eleitor nem a falhas na metodologia. A eleição presidencial estava para ser decidida no primeiro turno, segundo pesquisas de última hora; em São Paulo ocorreu uma virada da noite para o dia. Em outros estados o fato se repetiu e houve surpresas também em eleições para o Senado, como no Paraná, em que o apontado vencedor pelas pesquisas acabou no terceiro lugar.
Tudo isso pode ser resultado de fatores normais como mudança de voto no último momento, mas os institutos deveriam captar a tendência dos eleitores, afinal para isso é que são contratados. A menos que a orientação seja outra, que sejam verdadeiros os comentários e memes nas redes sociais chamando as empresas de pesquisas de ‘lojinhas de porcentagem’...
Porém, sem dúvidas, a mais significativa de todas as lições emergidas das urnas foi para o poluído quadro partidário: 15 das 32 legendas registradas não conseguiram cumprir a cláusula de desempenho, também chamada de cláusula de barreira. Seis partidos não atingiram a cláusula de barreira nas eleições de 2022: PTB, Novo, Solidariedade, Pros, PSC e Patriota. Eles se juntam a um segundo grupo, formado por siglas que já não tinham conseguido superar a cláusula em 2018 ou ainda não existiam: PCB, PCO, PMB, PMN, PRTB, PSTU, UP, Agir e Democracia Cristã (DC).
Esses partidos não desaparecerão, mas ficarão sem acesso a verbas públicas do fundo partidário e do fundo eleitoral e perdem também o tempo de propaganda no rádio e na televisão. Para sobrevivência em futuras eleições terão de formar federações com outros. Como ocorreu, por exemplo, com PV, Rede e PCdoB que decidiram formar federações partidárias para as eleições deste ano, o que garantiu o cumprimento da cláusula. Na prática, quando estão federadas, as legendas atuam como um único partido por um período de quatro anos, durante toda a legislatura.
O fato de a cada eleição novas siglas serem barradas pela cláusula de desempenho é um recado bem claro: se não alcançam a votação mínima exigida é porque não têm estrutura nem representatividade, ou seja, não têm voto. Ao não votar nos candidatos desses partidos o eleitor está mandando seu recado. Um enorme número de partidos que perderam ou nunca tiveram expressão não é salutar para o sistema político. Ultimamente os partidos são criados por lideranças dissidentes ou mal intencionadas, as siglas têm dono mas não possuem consistência programática e ideológica, representam interesses pessoais. No Brasil, fundar um partido é como abrir um negócio.
Nas democracias, o partido é peça fundamental e importante para a governabilidade. Quando o executivo precisa apoio do Congresso trata diretamente com a direção partidária, fecha os acordos e todos seguem a decisão do partido. Aqui não, como o eleitor vota mais em nomes do que em siglas, estas não são unas, coesas, criando dificuldades para o governo que precisa tratar individualmente, caso a caso. Daí decorre o nefasto sistema do toma lá, dá cá. Por isso é essencial que os partidos políticos sejam fortes e bem definidos.
O ideal é a existência de menos partidos, porém mais representativos e bem administrados. É melhor para a política, para a governabilidade e também para a democracia. Se os políticos e os legisladores não fazem ou não querem fazer mudanças o povo, na sua sabedoria, procura fazer.
É preciso aprender essa lição das urnas.
*Luiz Carlos Borges da Silveira é médico, ex-ministro da Saúde, ex-secretário de Ciência e Tecnologia do Governo do Estado do Tocantins e ex-secretário do Desenvolvimento Econômico, Ciência e Emprego do Município de Palmas-TO