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Estado

Foto: Rafael Batista/DPE-TO

Foto: Rafael Batista/DPE-TO

Durante cinco dias a Defensoria Pública do Estado do Tocantins fez uma escuta ativa em comunidades quilombolas de Dianópolis, Almas e Porto Alegre do Tocantins, na região sul do estado. A ação, iniciada na segunda-feira última, 26, e encerrada na sexta-feira, 1º de março, foi realizada em parceria com a Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins (COEQTO) e a Defensoria Pública da União (DPU).

Os atendimentos foram realizados pelo Núcleo da Defensoria Pública Agrária (DPagra), Núcleo Especializado de Questões Étnicas e Combate ao Racismo (Nucora) e Núcleo Aplicado de Minorias e Ações Coletivas (Nuamac) de Dianópolis, e também pela Defensoria Pública da União (DPU), além de instituições como o Instituto de Identificação do Tocantins, Receita Federal, Energisa, Secretaria de Estado da Saúde e Secretarias Municipais de Assistência Social.

A ação itinerante contemplou os quilombos de Lajeado (Dianópolis) e Lajinha (Porto Alegre), as comunidades São Joaquim (Porto Alegre), Baião (Almas) e Poço D´antas (Almas). Além dos atendimentos coletivos, as instituições também fizeram atendimentos individuais, sendo 40 pela DPE-TO de Dianópolis; 62 da Energisa, sendo 30 com esclarecimentos ao cliente; 60 emissões da nova Carteira de Identidade Nacional pelo Instituto de Identificação; mais de 40 atendimentos previdenciários da DPU; e 56 emissões de CPF pela Receita Federal.

Escuta Ativa

Segundo a coordenadora do DPagra, defensora pública Kenia Martins Pimenta Fernandes, em todas as comunidades a atividade contou com um momento de escuta ativa da população, com oportunidade de fala a fim de exporem suas realidades e apresentarem suas demandas.

“As principais reivindicações foram por território, vez que as comunidades ainda não possuem territórios titulados, e por vida em paz e com dignidade, visto que é uma constante a presença de tensões com os proprietários de terras vizinhas aos territórios quilombolas, em questões que vão desde a alteração de limites de posses, passam por disputa por acesso à água potável, dado que a região enfrenta períodos longos de estiagem, e chegam ao impedimento ou obstáculo de vias de acesso aos territórios. Algumas das questões pontuadas já se encontram judicializadas e vem sendo acompanhadas pelo Nuamac Dianópolis”, explicou a defensora pública.

 Kenia Martins afirmou que uma demanda comum a todas as comunidades foi a precarização ou dificuldade do acesso a serviços públicos tais como saúde, assistência social, energia elétrica, acesso à água potável. Presente na ação, a Energisa prestou esclarecimentos sobre o acesso às políticas de descontos para pessoas quilombolas e de baixa renda.  “A maior parte das comunidades é assistida por água oriunda de poços artesianos. Entretanto, o número de poços é insuficiente sendo imprescindível a perfuração de novos poços para acesso à água de qualidade”, destacou a Defensora Pública.

Educação

Também foi constatado durante os atendimentos, conforme o DPagra, que às crianças e adolescentes das comunidades apenas têm sido assegurados os serviços públicos de educação fornecidos nas zonas urbanas, sendo fornecido também transporte escolar. Entretanto foram pontuados problemas como condições inadequadas dos veículos que transportam as crianças, tais como a ausência de cintos de segurança, além de eventuais atrasos e faltas injustificadas durante a semana.

Outra reivindicação apontada foi a presença de escolas quilombolas dentro dos territórios. “Nos últimos anos as políticas adotadas pelos poderes públicos foi a da precarização das escolas até então existentes, obrigando pais e responsáveis a optarem por matricular os filhos em escolas urbanas, provocando o encerramento das atividades escolares na zona rural”, informou o DPAGRA.

Impactos ambientais

As comunidades reclamaram, ainda, do impacto ambiental decorrente tanto das culturas de soja presentes em áreas vizinhas, quanto das atividades de mineração desenvolvidas na região. Sobre as culturas de soja, pontuaram a existência de pulverização de agrotóxicos nas lavouras por meio de avião, muitas vezes manobrados em áreas limítrofes ou mesmo dentro dos territórios quilombolas, chegando a sobrevoar casas, fato que tem provocado a contaminação das moradias e da vegetação local e, ainda, a migração de pragas para as lavouras dos agricultores familiares, impactando suas colheitas.

“As atividades de mineração têm causado extrema situação de insegurança pela existência de barragem de rejeitos sem a comunicação de plano de fuga às comunidades, em caso de eventual vazamento. Existe ainda a suspeita de contaminação de rios e do lençol freático local e as populações locais tem se mostrado receosas em consumir a água, sobretudo dos córregos. As lideranças informaram que desconhecem a realização de estudos periódicos acerca da qualidade da água, sendo que a Coeqto já solicitou da empresa responsável informações sobre a existência desses estudos e acesso aos resultados, porém não teve qualquer resposta”, explicou a Coordenadora do DPagra.

As comunidades do município de Almas relataram também o impacto ocasionado na prestação de serviços de saúde pública local, decorrente do aumento populacional gerado pela presença da empresa de mineração.

Providências

A Defensoria Pública oficiará os gestores públicos acerca da dificuldade de acessar serviços públicos relatadas, bem assim as concessionárias responsáveis pelo fornecimento de água e energia elétrica. Quanto aos impactos ambientais relatados serão acionadas as Secretarias de Estado para acompanhamento da qualidade da água e verificação do impacto decorrente da pulverização de agrotóxicos. Será solicitado também a abertura de novos poços nas comunidades e maior fiscalização na qualidade da água e do abastecimento dos caminhões pipas.

ACP

A DPE-TO e a Coqto propuseram em dezembro do ano passado Ação Civil Pública (ACP) requerendo a suspensão para regularização das licenças ambientais vigentes da mineradora Aura Minerals, empreendimento localizado no município de Almas, região sudeste do estado. A medida se fez necessária devido aos possíveis impactos ambientais que podem afetar diretamente as comunidades quilombolas da região, haja vista que a licença para operação foi concedida antes da apresentação do Estudo do Componente Quilombola (ECQ) e Plano Básico Ambiental Quilombola (PBAQ).

A ACP aponta ainda a necessidade de atuação da Justiça para que o Instituto Natureza do Tocantins (Naturatins) cobre da Mineradora os estudos necessários no que tange às comunidades quilombolas, visando não somente a compreensão efetiva dos riscos existentes, mas também a implementação de medidas preventivas e corretivas que assegurem a integridade ambiental e a proteção das pessoas quilombolas residentes na área afetada. (DPE/TO)