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A prisão civil por dívida foi declarada ilegal pelo Supremo Tribunal Federal. Em sessão plenária na quarta-feira (3/12), os ministros concederam um Habeas Corpus a um depositário infiel, baseados em entendimento unânime de que os tratados internacionais de Direitos Humanos ratificados pelo Brasil — entre eles o Pacto de São José da Costa Rica, que proíbe a prisão por dívidas — são hierarquicamente superiores às normas infraconstitucionais. A elevação desses tratados à condição de norma com força constitucional, porém, não teve a maioria dos votos da Corte, que preferiu reconhecer somente que os acordos ratificados têm efeito supra-legal.

Embora tenha dado um passo importante em direção ao reconhecimento de normas internacionais de Direitos Humanos, o Supremo foi cauteloso quanto à elevação automática desses tratados à categoria de emenda constitucional, como queriam os ministros Celso de Mello e Ellen Gracie. A orientação foi do presidente do tribunal, ministro Gilmar Mendes. “Eu mesmo estimulei a abertura dessa discussão, mas as conseqüências práticas da equiparação vão nos levar para uma situação de revogação de normas constitucionais pela assinatura de tratados”, disse.

O caso que levou o assunto à discussão dos ministros foi o de um empresário preso em Tocantins por não cumprir um acordo firmado em contrato, de que manteria sob sua guarda 2,7 milhões de sacas de arroz, tidas como garantia do pagamento de uma dívida. Detido como depositário infiel, Alberto de Ribamar Ramos Costa pediu Habeas Corpus, alegando que tratados internacionais assinados pelo Brasil, como o Pacto de San José da Costa Rica — também conhecido como Convenção Americana de Direitos Humanos — e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos proíbem a prisão civil, exceto nos casos de inadimplência voluntária de pensão alimentícia. O acusado afirmou que a Emenda Constitucional 45, de 2004, elevou tratados internacionais de Direitos Humanos à hierarquia de norma constitucional, superior ao Código de Processo Civil, que regulamenta a prisão de depositário infiel.

A votação havia sido suspensa no início do ano, quando o ministro Menezes Direito pediu vista do processo. Em seu voto levado hoje ao Pleno, o ministro reconheceu o tratamento especial a ser dado aos tratados sobre Direitos Humanos, mas posicionou-se contrário à equiparação a normas constitucionais.

Os demais ministros seguiram em parte o entendimento. Por unanimidade, eles entenderam que, embora a própria Constituição Federal preveja a prisão do depositário, os tratados sobre Direitos Humanos ratificados pelo Brasil são superiores a leis ordinárias, o que esvazia as regras previstas no Código de Processo Civil, do Código Civil e do Decreto-Lei 911/69 quanto à pena de prisão. Sem regulamentação, as previsões da Constituição quanto à prisão perdem a efetividade, já que não são de aplicação direta.

Mas, por maioria, a corte seguiu o entendimento do ministro Menezes Direito, de que a Constituição previu, para a ratificação dos tratados, procedimento de aprovação no Congresso Nacional igual ao de emenda constitucional, ou seja, de maioria de dois terços na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, em dois turnos em cada casa.

Assim, por unanimidade, os ministros concederam o Habeas Corpus. Por maioria, deram à Emenda Constitucional 45/04 a interpretação de que os tratados internacionais de Direitos Humanos têm força supra-legal, mas infraconstitucional.

Conseqüentemente, a Súmula 619 do STF foi revogada pela corte, por sugestão do ministro Menezes Direito. A norma dizia que "a prisão do depositário judicial pode ser decretada no próprio processo em que se constitui o encargo, independentemente da propositura de ação de depósito". Para o ministro Celso de Mello, havia diferença entre o depositário legal — o que assina um contrato se comprometendo a guardar o bem — e o depositário judicial — o que aceita a ordem judicial para fazê-lo. Por isso, o depositário judicial não estaria imune à prisão. Já para o ministro Cezar Peluso, a ofensa aos direitos humanos com a prisão é a mesma para qualquer depositário e, por isso, ambos deveriam ter a mesma prerrogativa. Os demais ministros seguiram o entendimento e revogaram a súmula.

 

Da redação com informações Revista Consultor Jurídico