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Opinião

Luiz Carlos Borges da Silveira é médico e ex-ministro da Saúde

Luiz Carlos Borges da Silveira é médico e ex-ministro da Saúde Foto: Divulgação

Foto: Divulgação Luiz Carlos Borges da Silveira é médico e ex-ministro da Saúde Luiz Carlos Borges da Silveira é médico e ex-ministro da Saúde

Abordo dois temas correlatos, o alcance do foro privilegiado e a ‘indústria’ da corrupção instalada e arraigada no País, com nefastos efeitos na política e na administração pública. A correlação está justamente no fato de que a busca pela proteção concedida pelo foro liga-se basicamente a envolvidos em corrupção, raramente a delito político ou administrativo, escopo do foro por prerrogativa de função. Corrupção é crime comum, matéria do Direito Penal, não do Direito Administrativo, ainda que haja correlação.

Quanto ao foro privilegiado, instituto visto como proteção casuística a políticos a agentes públicos, o STF acaba de tomar decisão restringindo o alcance desse benefício. Em resumo, exclui senadores e deputados federais. Não era bem isso que a sociedade almejava, tanto que no dia em que a Suprema Corte retomou o julgamento da questão foi publicada pesquisa do Ibope revelando que ‘78% dos brasileiros querem o fim do foro privilegiado’.

Entendo que a posição tomada, mesmo que não seja a ideal, é um passo à frente porque coloca o tema no foco da discussão e, principalmente, abre a possibilidade de votação de projetos apresentados e não prosperados no Congresso exatamente pelo espírito corporativo. Afinal, seria ingenuidade pensar que parlamentares fossem aprovar lei acabando com seus próprios privilégios. Agora, já que perderam o benefício, nada mais há porque lutar e podem rever a questão, ampliando seu alcance, como a Proposta de Emenda Constitucional (PEC 10/2013) apresentada pelo senador paranaense Álvaro Dias, aprovada no Senado e ‘engavetada’ na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal.

Corruptos e corruptores 

Por mais irônico que pareça, a corrupção é assemelhada ao tráfico de drogas e idêntica também a discussão sobre o combate: não havendo uma ponta a outra tende a desaparecer. Este mal, a corrupção, não grassa apenas em nosso país, porém, aqui se tornou endêmico e nas últimas décadas transformou-se em epidemia a ponto de não mais preocupar. Corrupção, ou favorecimento no âmbito dos governos passou a ser visto como mal necessário. Foi com a Operação Lava Jato que os brasileiros tiveram consciência do tamanho do problema e de sua incrível engenhosidade operacional.

Depois disso, o combate focou uma parte do problema e o ataque se concentrou mais no efeito do que na causa; não que seja o método errado, mas certamente ineficaz para debelar ou ao menos reduzir o problema.

É sabido que não existirá o corrupto se inexistir o corruptor, é elementar...

Sabidamente, a maior parte dos atos de corrupção vem das empresas, das grandes e organizadas corporações que tomaram de assalto o estado brasileiro, evidentemente, com a conivência e associação a maus políticos, desonestos gestores públicos e dirigentes de estatais e organismos governamentais. Porém, só temos, via de regra, foco nos corruptos, deixando de lado os corruptores – com algumas exceções agora na Lava Jato.

Portanto, é sabido que para prosperar a corrupção é obrigatória a existência dessas duas partes, a que corrompe e a que se deixa corromper, sendo primário o raciocínio de que enquanto houver corruptores haverá corruptos dispostos a delinqüir em prejuízo do estado e minando recursos que poderiam estar sendo empregados em favor da população, notoriamente carente em assistência governamental.

Um diretor da Petrobras, estatal mais prejudicada pelo esquema, afirmou em depoimento à autoridade judicial que ”Não existe doação de campanha. São empréstimos a serem cobrados posteriormente, com juros altos, dos beneficiários das contribuições quando no exercício do cargo”.

Cabe aqui uma indagação simples: seria possível a existência de um corrupto sem a parceria com um corruptor? A resposta óbvia é ‘não’ e qualquer pessoa de bom senso e razoavelmente informada sabe que a corrupção ocorre porque dela participa ativamente  um interessado em obter vantagem ilícita, ou eliminando previamente eventuais concorrentes numa licitação, ou realizando menos do que o contratado ou, ainda, utilizando material inferior para aumento de seus ganhos. E não é raro que as pessoas mais atentas e informadas não tenham qualquer dúvida quanto à ação corruptora de uma empresa interessada, a qual, quando se trata de uma grande obra, com frequência é uma empresa de grande porte. E os agentes dessa corrupção, os que, valendo-se de seu poder econômico ou de sua influência política, envolveram servidores em práticas de corrupção, esses até agora ficaram ocultos e impunes, apesar de causarem prejuízos, às vezes muito graves, ao interesse público.

A razoabilidade nos indica que devemos ter agentes públicos honestos, devemos, da mesma forma, termos dirigentes empresariais igualmente corretos. Ou seja, espera-se a fiscalização das empresas que se relacionam com o governo na prestação de serviços. Recentemente o governo editou normas para combater a corrupção em seu meio, porque, evidentemente não pode ditar normas dessa natureza ao setor empresarial.

Então, cabe ao sistema empresarial ditar normas de boa conduta a gerentes e diretores de organizações, ou seja, cabe às entidades fiscalizar a ação das corporações. Exemplificando: um médico tem sua atuação profissional fiscalizada pelo Conselho Regional de Medicina, assim como o advogado está subordinado à OAB. Portanto, cabe às Federações e Confederações o exercício dessa norma, desde que estejam realmente interessadas, posto que banir práticas ilícitas, como a corrupção, é um dever nacional. Tais entidades, que por essência são fiscalizadoras, têm o dever de zelar pela conduta de seus filiados.

Fazer sua parte para sanear o Brasil é dever de todos e, principalmente dessas entidades. Têm elas o poder de impor sansões a empresas e seus dirigentes quando pegos em ilícitos – no caso a corrupção de agentes públicos. A Federação pode, cautelarmente, impedir sua filiada de participar de atos que resultarão em contratos com governos, desde que tenha esta sido envolvidas em falcatruas – esse é o termo – contratuais. Seria, em termos, a aplicação da ‘ficha suja’ a empresas e/ou seus dirigentes.

Repito, combater a corrupção é obrigação geral. Assim como a Polícia Federal, o Ministério Público e o Judiciário deve também o empresariado colaborar.

*Luiz Carlos Borges da Silveira é médico, ex-ministro da Saúde, ex-secretário de Ciência e Tecnologia do Governo do Estado do Tocantins e ex-secretário do Desenvolvimento Econômico, Ciência e Emprego do Município de Palmas-TO