Em votação simbólica, o Plenário do Senado aprovou nesta terça-feira, 2, o Projeto de Lei de conversão originado da Medida Provisória que muda regras da lei de gestão de florestas públicas por concessão (Lei 11.284, de 2006), permitindo a exploração de outras atividades não madeireiras e o aproveitamento e comercialização de créditos de carbono. A MP 1.151/2022 foi aprovada na forma do relatório do senador Jorge Kajuru (PSB-GO), que ratificou o substitutivo aprovado na Câmara dos Deputados, e segue para sanção presidencial.
O texto aprovado permite a outorga de direitos sobre acesso ao patrimônio genético para fins de pesquisa, desenvolvimento e bioprospecção e sobre a exploração de recursos pesqueiros ou da fauna silvestre. No edital da concessão para exploração das florestas, poderá ser incluído o direito de comercializar créditos de carbono e instrumentos congêneres de mitigação de emissões de gases do efeito estufa, inclusive com percentual de participação do poder concedente. Poderão ser objeto da concessão da floresta produtos e serviços florestais não madeireiros, desde que realizados na unidade de manejo, nos termos de regulamento.
Senadores aprovaram texto de MP que permite exploração de atividades não madeireiras e comercialização de créditos de carbono (Foto: Jonas Pereira/Agência Senado)No substitutivo, os deputados incluíram dispositivo que permite ao concessionário unificar operacionalmente as atividades de manejo florestal em unidades contínuas. Se situadas na mesma unidade de conservação, isso também poderá ocorrer, ainda que de concessionários diferentes. Um termo aditivo aos contratos fixará as condições e permitirá a elaboração de um único plano de manejo florestal sustentável (PMFS), cabendo ao órgão gestor fazer as adequações necessárias em razão do ganho de escala, acrescentando compromissos assumidos nas propostas vencedoras. Caberá ao poder público evitar e reprimir invasões nas áreas concedidas e sujeitas à concessão florestal, seja a partir de comunicação do concessionário ou de ofício, sem prejuízo da legitimidade do concessionário para a defesa e retomada da posse, inclusive por via judicial.
O plano anual passará a ser um plano plurianual de outorga florestal (PPAOF), com duração de quatro anos e prazos compatíveis com o plano plurianual (PPA) de natureza orçamentária. De acordo com a lei, o plano é proposto pelo Serviço Florestal Brasileiro (SFB) e definido pelo poder concedente, contendo o conjunto de florestas públicas a serem concedidas no período em que vigorar.
Já a redação proposta na MP retira a exigência de que esse plano inclua a estimativa dos recursos humanos e financeiros necessários às atividades de monitoramento e fiscalização ambiental a cargo do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e de outros órgãos do Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama).
A exploração de florestas nativas continuará a depender de licenciamento ambiental, mas pelas regras do Código Florestal, que não cita exigências mais restritas como o estudo de impacto ambiental (EIA), antes exigido em função da escala da retirada de madeira prevista no plano de manejo. A exceção será para as concessões de conservação e restauração, que serão dispensadas de licença ambiental. Quanto ao prazo para o concessionário resolver problemas apontados por auditoria para manter o contrato, o texto aumenta de 6 meses para 12 meses.
Quando o contrato for extinto por rescisão, anulação, falência ou falecimento do titular — se for empresa individual —, ou desistência e devolução por opção do concessionário, o texto permite ao poder concedente convocar os licitantes remanescentes na ordem de classificação. Isso será possível se o contrato tiver sido extinto em até dez anos de sua assinatura e o novo concessionário deverá: aceitar os termos do contrato anterior, inclusive quanto aos preços e à proposta técnica atualizados; manter os bens reversíveis existentes; e dar continuidade ao ciclo de produção florestal iniciado.
A fim de adequar os termos da lei aos tipos de seguros ofertados no mercado, o texto da MP os separa em duas categorias: seguro de responsabilidade civil e garantia de execução contratual. O primeiro abrange eventuais danos causados ao meio ambiente ou a terceiros como consequência da execução das operações de manejo florestal. Já a garantia de execução deverá cobrir a inadimplência de obrigações contratuais e as sanções por descumprimento do contrato.
Caso o infrator seja condenado em ação civil a pagar indenizações por atividades associadas ao contrato de concessão florestal, o valor da execução do seguro de responsabilidade civil será deduzido do que já tiver sido pago a título de indenização. O texto permite que o regulamento defina o pagamento do seguro e da garantia em fases, de acordo com a implementação dos contratos e das atividades de manejo florestal sustentável. Em todo caso, tanto o seguro quanto a garantia serão reajustados conforme definido em regulamento e no edital.
De acordo com a MP, recursos do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima, criado pela Lei 12.114, de 2009, poderão ser intermediados por bancos privados e fintechs para financiar projetos de recuperação de áreas degradadas ou de redução de gases do efeito estufa, por exemplo. Antes da MP, somente o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), o Banco do Brasil e a Caixa podiam atuar como agente financeiro. Entretanto, cada banco assumirá os riscos de suas operações.
A MP também permite o uso de parceria público privada para fins de concessão das florestas públicas para esse tipo de manejo.
Discussão
Em seu relatório, Jorge Kajuru sublinhou que, na edição da MP, o próprio Poder Executivo lembrou o compromisso do país de reduzir em 50% suas emissões de dióxido de carbono até 2030 para cumprimento do Acordo de Paris, o que justifica a relevância e a urgência da medida. Para ele, o projeto de lei de conversão promove “substanciais e importantes aprimoramentos” ao texto da MP em pontos importantes, como na responsabilidade do poder público para evitar e reprimir invasões nas áreas concedidas e nas definições de concessão florestal e área de manejo.
“A concessão florestal é um importante instrumento de combate ao desmatamento e ao comércio ilegal de madeira. A ocupação das áreas por empresas que praticam o manejo sustentável, sob a fiscalização da União, inibe invasões, grilagens e degradação ambiental. Além disso, é preciso abastecer o mercado de madeira de origem legal como forma de permitir a substituição da madeira oriunda de desmatamentos ilegais e predatórios por madeira explorada com técnicas sustentáveis”, diz o relator.
O Projeto de Lei de conversão e o relatório de Kajuru receberam elogios na discussão da matéria, mas vários senadores cobraram um debate aprofundado sobre o tema. Rogério Carvalho (PT-SE) pediu atenção, entre outras questões, para o problema da regularidade das terras geradoras de créditos de carbono.
"É preciso um lugar para escriturar esses créditos, pois não podem ser comercializados mais de uma vez. Quem compra tem que ter a segurança de que algo é verdadeiro", alertou.
Otto Alencar (PSD-BA) também disse ser necessário um aprofundamento na regulamentação dos créditos de carbono diante do agravamento das mudanças no clima. "Será um ganho para o País e também para todos aqueles que acreditam que o clima só será mantido em condições estáveis com a preservação do meio ambiente, com a preservação das nossas florestas".
Por sua vez, o senador Marcos Pontes (PL-SP) espera que os créditos de carbono possam expandir conhecimento e desenvolvimento. "A gente conhece só 4% da biodiversidade da Amazônia. Há a possibilidade de utilização de recursos como esse para o conhecimento do bioma e também para o desenvolvimento de novos projetos, por exemplo, projetos de regeneração".
Jaime Bagattoli (PL-RO) pediu atenção ao plano de manejo de áreas florestais em vigor em Rondônia, que considera rentável ao Estado, e sugeriu ampliar o mecanismo para incluir parcialmente as reservas indígenas. No mesmo sentido, Luis Carlos Heinze (PL-RS) disse esperar que os créditos de carbono permitam ao País aproveitar o “potencial fantástico” das áreas protegidas.
Também os senadores Esperidião Amin (PP-SC) e Vanderlan Cardoso (PSD-GO) destacaram a importância do projeto. (Agência Senado)